Pousa num ramo um sopro de agonia dos que morrem (sem saber) em nosso coração. Suspira a noite no vento vadio. Amados mortos: tentais dizer o quanto amais ainda?
Não desejes, nem sonhes, alma incauta, Que a ilusão tem o encanto da sereia, Que em noites aromais de lua cheia Seduz e perde, em alto-mar, o nauta. Feliz daquele que os seus atos pauta Dentro dos dons da vida que o rodeia, E acha o leito macio e a mesa lauta Na indiferença da fortuna alheia. Feliz de quem, da vida para a morte, Embora pobre, de pobreza triste, Se contenta, afinal, com a própria sorte. Se há ventura no mundo, essa consiste, Talvez, em suportar, de ânimo forte, A renúncia de um bem que não existe. Da Costa e Silva
XIX Teus passos somem Onde começam as armadilhas. Curvo-me sobre a treva que me espia. Ninguém ali. Nem humanos, nem feras. De escuro e terra tua moradia? Pegadas finas Feitas a fogo e espinho. teu passo queima se me aproximo. Então me deito sobre as roseiras. Hei de saber o amor à tua maneira. Me queimo em sonhos, tocando estrelas. Hilda Hilst In Poemas Malditos Gozosos E Devotos (1984)
Os mortos chegam pisando com pés de flores tocam violetas temem o brilho das rosas luas de nácar desfazem na grama lúnulas maculas de pólen e as mínimas flores da deslembrança. O silencio agita sombras. O que buscais amados mortos pisando com pés de flores: o odor de dias idos nas magnólias? Raízes de que saudade? Ah delírio de girassol da noite! Só o vento desliza. Os amores-perfeitos (eles buscam) e outros de azulada memória. Dora Ferreira da Silva Poesia Reunida (1999)
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